Gestão democrática, cortes no orçamento da educação e o PNE marcam debate da CONAPE em Porto Alegre

Os Eixos V e VI da Conferência Nacional Popular (CONAPE), respectivamente “Gestão democrática e financiamento da educação: participação, transparência e controle social” e “Construção de um projeto de nação soberana e estado democrático em defesa da democracia, da vida, dos direitos sociais, da educação e do PNE”, foram debatidos no encerramento da Etapa Municipal de Porto Alegre da CONAPE 2022, realizada dia  21, que teve como destaque os cortes no orçamento federal para a educação. 

Abertura

O evento teve início com a exibição do vídeo “Um cordel para Paulo Freire”, produzido pelo Instituto Paulo Freire. A seguir, a professora Sônia Mara Ogiba, diretora de Comunicação da ADUFRGS-Sindical, entidade coordenadora do Fórum Municipal de Educação de Porto Alegre (FME-POA), junto ao CPERS-Sindicato e ACPM-Federação, fez a abertura, saudando os presentes e fazendo um registro, para a memória da conferência, sobre a criação do Fórum. 

“O Fórum Municipal de Porto Alegre foi criado pelo decreto nº 19.448 de 19 de julho de 2016, considerando: a lei federal nº 13.005, de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação, o PNE; a lei municipal nº 11.858, de 25 de julho de 2015, que institui o Plano Municipal de Porto Alegre em seu artigo 5º; também as deliberações da Conferência Nacional de Educação de 2010; e a necessidade de institucionalizar mecanismos de planejamento educacional participativo e com relações democráticas, dentro do espírito de uma gestão democrática”, historicizou a professora Sônia Ogiba. “Foi assim que o FME foi criado e está se consolidando. Dele participam diversos atores de várias instâncias e âmbitos”, relatou. 

A diretora também relembrou que a CONAPE tem o objetivo de mobilizar todos os setores e segmentos da educação nacional e no Rio Grande do Sul. “Segmentos esses dedicados à defesa do estado democrático de direito, da Constituição Federal de 1988, do Plano Nacional de Educação (PNE) e de um projeto de estado que garanta educação pública, gratuita, inclusiva, laica, democrática e de qualidade social para todas e todos”, introduziu a professora, que lamentou os prejuízos ocorridos desde 2016. “A secundarização do PNE não é um acidente”, denunciou. 

Ao recuperar as discussões dos primeiros dias de evento, a professora Sônia citou a “enérgica afirmação” do professor Luiz Dourado, da Universidade Federal de Goiás (UFG) e membro do Fórum Nacional Popular de Educação (FNPE), de que “é necessário a retomada do humano que habita em todos nós. E isso passa pela democracia, pela vida e por concepções”. A professora Mariangela Bairros, por sua vez, afirmou ser preciso “falar, sim, do desmonte que está ocorrendo no estado do Rio Grande do Sul e em Porto Alegre’”, destacou a professora Sônia.

A diretora citou ainda o poema “Revolta”, de Pedro Gorki, ex-presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) e vereador de Natal, lido por Alejandro Guerrero, da UBES, que faz uma convocação para que todos e todas se revoltem contra a destruição pela qual a educação pública vem passando, assim como o próprio país. “Saímos daqui nesse dia com a firme convicção de que a CONAPE em Porto Alegre e no RS estará simbolizada por essa poesia, que é a ‘Revolta’ – a revolta com a destruição”, afirmou Sônia. 

Exposição dos eixos

O Prof. Nilton Brandão, presidente do PROIFES-Federação e membro da coordenação executiva do FNPE, abordou a Reforma Administrativa. Para ele, a PEC 32/2020 é “algo que deveria estar no coração de todos os servidores, não só do serviço federal, mas parece ainda não ter chegado aos municípios e até nos estados”. Para Brandão, essa PEC “conclui a reforma do Estado que o governo Bolsonaro pretende implementar neste país, com as destruições todas que vêm sendo discutidas”.

Sobre o eixo “Gestão democrática e financiamento da educação: participação, transparência e controle social”, Brandão comentou que a democracia, a justiça social, o combate às desigualdades, não são coisas diferentes. “Elas dialogam entre si e nos chamam a resgatar a trajetória de lutas por políticas que acreditamos, que respeitem a diversidade”, ensinou. 

O professor comentou a falta de liberdade de escolha das entidades na escolha de seus próprios dirigentes, e condenou a prática, “mesmo que haja uma lei que permita”. “Bolsonaro colocou, direta ou indiretamente, interventores em 19 universidades”, criticou.

Sobre o financiamento, condenou o “corte drástico” de investimentos. “[O ministro Paulo] Guedes tirou 92% do previsto, R$ 690 milhões, ficando apenas R$ 89 milhões, o que mostra que o orçamento está totalmente comprometido. As universidades só vão sobreviver devido à economia com água e luz permitida com o trabalho remoto durante a pandemia”, relatou. 

Sobre o eixo VI, pontuou a necessidade de um projeto de nação soberana, e comemorou a aprovação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e a importância da luta do dinheiro público ser destinado à educação pública. Brandão ratificou a defesa do estado democrático de direito em consonância com a Constituição Federal, dentro da premissa definida pelo FNPE para a CONAPE 2022.

Debate sobre os eixos

Para debater os eixos, constantes no Documento Referência da CONAPE 2022, foram convidados a debater a Dra. Maria Luiza Flores, do Fórum Gaúcho de Educação Infantil (FGEI) e professora da UFRGS/FACED, e a Dra. Isabel Leticia Pedroso de Medeiros, ex-presidenta do Conselho Municipal de Educação de Porto Alegre (CME-POA). 

Isabel Medeiros declarou que “a democracia é incompatível com esse projeto [de governo] em curso”. “Para esse projeto, é fundamental derrotar a democracia, porque a população agora se dá conta do que está errado”, disse a professora. 

“O texto do Documento Referência associa a gestão democrática ao financiamento. O PNE previa novos investimentos, mas, ao contrário, houve desinvestimento, com redução drástica. O cenário é gravíssimo”, denunciou Isabel, que comentou que o texto pergunta o que fazer para garantir o financiamento, mas acrescentou que é preciso questionar o que fazer para garantir uma gestão democrática. “Temos que nos reinventar e chamar os jovens para a luta, que vai demandar muita energia”, concluiu.

Maria Luiza Flores, ao ter a palavra, disse que o financiamento “atinge principalmente a aplicação das metas [do PNE]”. “A estimativa é de baixíssimo alcance. Dificilmente teremos realizadas as metas, principalmente as relacionadas ao acesso e permanência”, disse a professora. “Não nos cabe a neutralidade no campo da educação”, acrescentou. 

Sobre o eixo VI, disse que o texto fecha o conjunto do que deve ser buscado, e fez outro alerta. “Corremos o risco de não alcançar a universalização da pré-escola até 2024, que era de 50%”, lamentou Maria Luiza.

A representação estudantil ficou a cargo de Ariel Lucena, da União Nacional dos Estudantes Rio Grande do Sul (UNE-RS). O estudante disse que, na cidade de Porto Alegre, houve um aumento da entrada de pessoas na universidade por meio de ações afirmativas, mas que agora o futuro está ameaçado. “Temos um reitor que não é legítimo, que é antidemocrático. O projeto de Bulhões vai contra o acesso, é bolsonarista, pode ser o primeiro reitor a reduzir esse acesso”, afirmou o estudante. Ariel ainda recuperou ações do governo como o veto à lei da conectividade e os cortes de recursos.

A manifestação da União Metropolitana dos Estudantes Secundários de Porto Alegre (UMESPA) não ocorreu devido a problemas de conexão no momento da fala de Anderson Farias, representante da entidade. 

Plenária e moção de repúdio

Após o debate e considerações finais, foi realizada a plenária da conferência, conduzida pela coordenadora do FME-POA, professora Sônia, e pelos coordenadores adjuntos Rosane Zan, do CPERS-Sindicato, e Antônio Saldanha, da ACPM-Federação. 

Sem emendas a serem destacadas, a plenária final da etapa municipal de Porto Alegre aprovou em um ato de aclamação o Documento de Referência da CONAPE 2022 “em defesa da reconstrução do país, da retomada do estado democrático de direito, e da defesa da educação pública com gestão pública, democrática, laica, inclusiva, e de qualidade social para todos, todas e todes”. 

Durante a plenária foi também aprovada uma moção de repúdio proposta pela estudante Juliane Gonçalves, da União Brasileira de Mulheres (UBM) e União da Juventude Socialista, repudiando o episódio de racismo ocorrido na véspera na Câmara de Vereadores de Porto Alegre. Também foi aprovada a sugestão do professor Marco Aurelio Ferraz de um registro no relatório da etapa municipal da CONAPE sobre a “necessidade de um congresso municipal para discussão das questões pedagógicas de Porto Alegre”, assinada também

pela ampla maioria das entidades presentes na conferência.

Ao final se pronunciaram a professora Rosane Zen, sobre a necessidade de pressão contra a reforma administrativa, que conclamou a todos para “seguir nesse processo de resistência” na CONAPE, e o professor Antônio Saldanha, que lembrou o cenário de crise em que “o povo está comprando ossos para sobreviver” e que é nesse sentido que se torna ainda mais importante a mobilização de todos.

A professora Sônia Ogiba agradeceu às entidades participantes, aos relatores e à coordenação colegiada do FME. Agradeceu ao Sindicato dos Servidores de Nível Superior do Poder Executivo do Estado do Rio Grande do Sul (SINTERGS), integrante da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), que foi responsável pelas transmissões dos três dias de debates pelo YouTube. A professora encerrou a plenária final lendo um trecho da obra “A educação como prática da liberdade”, de Paulo Freire, escrito na primavera de 1965. Sônia também convidou a todos e todas para a etapa estadual da CONAPE 2022, que deve ocorrer em novembro deste ano.

Assista a live completa aqui. Confira como foi o primeiro encontro, no dia 19 (vídeo aqui), e o segundo, dia 20 de outubro (vídeo aqui).

Veja algumas manifestações no chat do Google Meet e do YouTube 

Graciela Quijano – ​Boa tarde a tod@s. Assistindo e acompanhando o evento. ADUFRGS-Sindical, presente.

Neiva Ines lazzarotto – 39° Núcleo do CPERS – A gestão democrática, ainda é grande desafio. Retrocedemos muito! 

Antonio Saldanha – Em 2020 no CEED o governo não nomeou os conselheiros e tivemos que lutar na Justiça. Muito boas as colocações dos prof. Brandão e Leticia 

Rosa Mosna – Excelentes as falas do nosso evento, Prof. Nilton, Isabel Medeiros e Malu Flores. Parabéns

Rosane Zan CPERS – Parabéns pelas belas falas de resistência diante de tantos ataques que estamos sofrendo por parte de governos neoliberais que não priorizam as políticas educacionais públicas. 

Brandão Nilton – PROIFES – Obrigado demais pelo carinho companheiras e companheiros. Grande abraço

Célia Trevisan – Mais um dia de encontro e trocas com ótimas e potentes falas.  Parabéns a tod@s!

 

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