No dia 6 de novembro o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela constitucionalidade da Emenda Constitucional 19, promulgada em 4 de junho de 1998. A EC 19 suprimiu a obrigatoriedade de regimes jurídicos únicos (RJU) e planos de carreira para servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas federais, estaduais e municipais, permitindo a contratação de servidores públicos pelo regime da CLT. Agora, por maioria de votos, o Tribunal entendeu que não houve irregularidades no processo legislativo de aprovação da emenda. As consequências, porém, ainda estão por vir.
Entenda o trâmite
A chamada Reforma Administrativa tramitou por três anos no Congresso sob o número PEC 173/1995, de iniciativa do Poder Executivo. Essa tramitação, tensa, foi questionada judicialmente e gerou a proposição de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) por partidos de oposição da época (PT, PDT, PSB e PC do B). Os partidos sustentaram que teria havido uma manobra da relatoria e o texto não teria sido aprovado em dois turnos por 3/5 dos votos dos parlamentares das duas casas, Senado e Câmara, como manda o regulamento. Também questionava a constitucionalidade de artigos da EC 19, alegando ferir cláusulas pétreas.
Em 2007, a vigência da alteração foi suspensa, e o texto original permaneceu válido até agora. O mérito da ADI começou a ser julgado em 2020, com o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia, pela inconstitucionalidade da alteração. Em 2021, o ministro Gilmar Mendes abriu divergência, e seu entendimento prevaleceu na conclusão do julgamento.
A decisão só valerá para futuras contratações, sem a possibilidade de mudança de regime dos atuais servidores. A liminar anteriormente deferida, que havia suspendido a alteração, foi revogada.
O que vem por aí
Conforme o escritório Bordas, o Regime Jurídico único (RJU), previsto na Lei 8112/90, segue existindo. Ele apenas deixa de ser a “única” forma de novos ingressos no funcionalismo. A administração deixa de estar obrigada a suprir sua carência de pessoal apenas através da relação estatutária, o que não quer dizer que não possa optar por essa modalidade.
As aposentadorias, ainda de acordo com o escritório, não são afetadas pela decisão – em que pese as diversas reformas existentes até aqui e a falta de garantia de que outras venham a ocorrer.
Mas, mesmo que a decisão do STF não afete os servidores públicos atuais, nem dispense os concursos públicos, afeta o futuro, e a ADUFRGS-Sindical considera que esta é não só uma derrota para o setor público, por fragilizar o trabalho e os trabalhadores que virão, mas também por prejudicar os serviços, o acesso e a qualidade deles à população. Ou seja, mais do que os direitos trabalhistas, está em jogo o direito que a sociedade tem aos serviços públicos.
Ao fragilizar a estabilidade dos servidores, já que a demissão passa a ser permitida de maneira simplificada, também podem ser abertas as portas para demissões arbitrárias. Desprotegidos, os servidores poderão ser demitidos por fazer denúncias ou não atender a interesses pessoais de gestores.
O trabalho da assessoria jurídica da ADUFRGS-Sindical indica que será preciso trabalhar pela unidade de uma carreira tanto para novos celetistas como para os estatutários que seguirão no Regime Jurídico, sob pena de haver salários distintos para a mesma tarefa. O primeiro passo é revisar a legislação de regência de cada carreira para verificar a necessidade de se estender aos celetistas direitos que hoje valem para os estatutários. Também será indispensável revisar os estatutos dos sindicatos e associações para que não se restrinjam à representação sindical aos “ocupantes de cargos públicos”.