A educação pública, que deveria ser uma área prioritária para superar as desigualdades sociais e contribuir com o desenvolvimento do Brasil, mais uma vez é tratada com descaso.
Os vetos do Governo Jair Bolsonaro ao Orçamento da União de 2022, que foram aprovados pelo Congresso Nacional, causaram um déficit de R$ 739,9 milhões ao Ministério da Educação. A medida sancionada pelo governo federal, dia 24 de janeiro, atingiu o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que perdeu R$ 499 milhões do orçamento.
De acordo com a Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (FINEDUCA), o montante previsto para as ações do MEC destinadas à pesquisa, inovação e reestruturação das Instituições Federais de Ensino Superior era de R$ 288.496.657,00 e os vetos alcançaram R$ 99.732.624,00, um corte equivalente a 34,6% dos recursos aprovados pelo Congresso.
Segundo o diretor de Relações Internacionais do PROIFES-Federação e diretor tesoureiro da ADUFRGS-Sindical, Eduardo Rolim, a atitude do governo federal vai na contramão da conjuntura nacional. “No momento que o País mais precisa de investimentos para produção de pesquisas, vacinas e valorização de profissionais que atuam na linha de frente no combate à pandemia de Covid-19, o governo inviabiliza a educação e a ciência”, destacou.
O governo federal vetou R$ 859 mil, que seriam destinados aos projetos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). A Fiocruz, que desempenha um papel importante na imunização contra o coronavírus, sofreu um corte de R$ 11 milhões. Os vetos também atingem as ações graduação, pós-graduação, ensino, pesquisa e extensão, que perderam R$ 4,2 milhões. A redução no orçamento afeta ainda os projetos de reestruturação e modernização das instituições federais de ensino superior.
Mas não é de hoje que a educação perde investimentos. Segundo um estudo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, realizado em 2021, o MEC teve uma redução de mais de R$ 30 bilhões em comparação a 2015. Desde então, os professores e professoras não tem diálogo e negociação salarial com o governo. Inclusive, o ponto 14 da pauta de reivindicações da campanha salarial 2022 do PROIFES-Federação e ADUFRGS-Sindical, protocolada dia 25 de janeiro nos ministérios da Educação e da Economia, propõe a instituição de uma mesa de negociação permanente, com reuniões regulares, para debater os assuntos pertinentes às Universidades e Institutos Federais.
A defasagem salarial de 2017 até janeiro de 2022 é de 32,9% e abrange mais de 150 mil docentes federais do Magistério Superior (MS) e do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (EBTT). O índice de 32,9% é um dos itens da pauta de reivindicações da campanha salarial 2022 para recompor as perdas salariais desde março de 2015, ano que a categoria teve o maior salário desde a implantação do Plano Real.
Conforme destaca Rolim, a criação da Emenda Constitucional 95, do Teto de Gastos, foi determinante na redução do orçamento em educação nos últimos anos. A EC 95, publicada em 2016, limita os gastos públicos em políticas sociais como educação, saúde e segurança. “Na campanha salarial deste ano, estamos pleiteando a recomposição do orçamento da educação, ciência e tecnologia a níveis de 2016, porque na época não havia limitação da EC 95 e de lá pra cá começou a diminuir o gasto público com educação e ciência”, observou.
Em 2021, a redução no orçamento do MEC atingiu R$ 3,8 bilhões. Nesse período, a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica perdeu R$ 770 milhões do orçamento com a redução, cortes e bloqueio aprovados pelo Congresso Nacional. Tal medida prejudicou o funcionamento dos institutos federais e os editais de ensino, pesquisa e extensão, tais como bolsas para atendimento à comunidade acadêmica.
Desfinanciamento da educação preocupa universidades
De acordo com a reitora Lucia Pellanda, da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), o orçamento de custeio das universidades federais brasileiras somadas teve uma redução de R$ 3,5 bilhões entre 2014 e 2021. Esse período também registrou uma queda de R$ 2,7 bilhões em recursos para infraestrutura e insumos das instituições. A UFCSPA que possuía, em 2015, orçamento para investimentos no valor de R$ 25,3 milhões, em 2021 teve apenas R$ 1,9 milhões. Para o custeio, a universidade tinha R$ 40,98 milhões em 2018 e, no ano passado, contou com apenas R$ 26,31 milhões. “Foi um esforço muito grande das universidades para conseguir gerir orçamentos menores com aumento de despesas. Houve toda uma reorganização, mas chegamos no limite do que conseguimos fazer”, afirmou.
A reitora em exercício Martha Adaime, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), destacou que o orçamento para custeio e investimentos da instituição era de R$ 181,66 milhões em 2015. Em contrapartida, a previsão orçamentária para esse ano é de apenas R$ 125,47 milhões, que impacta na redução de 55% em valores atualizados. Ela salienta que as universidades federais destinam 10% dos recursos discricionários para investimentos, enquanto a UFSM consegue investir apenas 4% de seus recursos em razão de todas as despesas e contratos em vigor. “Pelos números, observamos o estado de desfinanciamento real que estamos vivendo. Não há outra maneira de levar uma nação senão investindo em educação, saúde, ciência e tecnologia e inovação” afirmou.
Na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) a realidade não é diferente. Conforme a reitora Isabela Andrade, a instituição teve apenas R$ 2 milhões para investimentos em 2021 e fechou o ano com um déficit de R$ 5 milhões. “Em 2022, a gente não está com orçamento de 2019 e ainda temos o déficit de 2021. O nosso objetivo é que a gente feche um ano na ordem de 2,5 milhões, reduzindo o déficit que ficou de 2021”, projetou.
Reitoras debatem o desfinanciamento das universidades públicas em live da ADUFRGS-Sindical